Sobre o guia

Este guia apresentou o panorama da micromobilidade compartilhada no Brasil e no exterior. Trata-se de um trabalho de suma importância para gestores públicos e privados e outras pessoas interessadas em promover soluções de micromobilidade para as cidades brasileiras. Por se tratar de um trabalho sem paralelos no país, o guia objetivou se tornar uma referência nacional na conceituação, no levantamento de exemplos e referências e nas formas de operação e proposição de indicadores e métricas de melhores práticas (benchmarking) de micromobilidade compartilhada.

Além disso, o guia aprofundou a conceituação de micromobilidade, de sistemas compartilhados e dos tipos de operação desses sistemas. Foi buscada a “tropicalização” da discussão para tratar com maior propriedade das particularidades e da realidade brasileira. Dessa forma, os micromodais foram investigados a partir de oito dimensões analíticas.

A subdivisão proposta neste guia permite lançar luz às particularidades da micromobilidade com foco na implantação e no aprimoramento dos sistemas de micromobilidade compartilhada, apontando dentro de cada dimensão proposta um grupo de subdimensões, com exemplos de melhores práticas nacionais e internacionais, de forma a criar um marco na operacionalização e criação de estratégia para gestores públicos e privados na implementação de sistemas de micromobilidade no Brasil.

Objetivos / justificativa

Primeiramente, o guia apresenta o conceito de micromobilidade, de sistemas compartilhados e suas formas de operação. Esta discussão foi trazida para o contexto brasileiro de forma a permitir o entendimento de suas particularidades no território nacional.

A partir deste ponto foram definidas dimensões para implantação e aprimoramento de sistemas compartilhados, apontando indicadores para a avaliação dos sistemas para as cidades brasileiras. Para cada dimensão, são apresentadas melhores práticas nacionais e internacionais, de forma a criar um marco na operacionalização e criação de estratégia para gestores públicos e privados na implementação de sistemas de micromobilidade no Brasil.

Assim, este trabalho é o primeiro a organizar nacionalmente o tema da micromobilidade a partir da observância das melhores práticas, que se torna um indicador da replicabilidade destas ações no cenário urbano brasileiro.

O mundo passa por grandes mudanças no campo da mobilidade urbana. Observa-se que grandes cidades estão repensando e promovendo mudanças profundas nas formas de se deslocar em seus espaços urbanos, privilegiando o deslocamento a pé, por bicicleta, por transporte público e por modos de viagem mais sustentáveis.

Sistemas de Micromobilidade nas cidades brasileiras

Devido ao dinamismo característico do cenário da mobilidade urbana e do mercado da micromobilidade, ainda em fase de expansão na América Latina, encontram-se incipientes as iniciativas de monitoramento periódico de dados sobre os sistemas compartilhados nas cidades brasileiras.

Com a intenção de aumentar o conhecimento sobre esses sistemas, a Plataforma Micromobilidade Brasil (2019, 2020) e a Plataforma Latino-Americana de Sistemas de Bicicletas Públicas e Compartilhadas (LatinoSBP, 2020) produziram relatórios que reduzem essa lacuna e auxiliam no mapeamento e na transparência das informações sobre esses sistemas. O primeiro identifica operadores atuantes no mercado brasileiro, modelos de arranjos institucionais e o impacto positivo da utilização de bicicletas e patinetes nas cidades brasileiras através da quantificação das emissões de CO2 evitadas por dia (8,197 tCO2e) e seus benefícios para a qualidade de vida nos centros urbanos

Mapa com a localização das iniciativas de micromobilidade no Brasil. Fonte: Plataforma Micromobilidade Brasil (2020).

O segundo analisou dados de 92 sistemas de bicicletas compartilhadas ativos em 2019. Foram identificados 11 países com tais sistemas  na América Latina, destacando-se a predominância dos sistemas com estação (73%) e a representatividade do Brasil em número de sistemas (42) no continente, seguido pela Colômbia (18) e pelo México (15). Em relação ao tamanho populacional das cidades onde os sistemas foram implementados, constatam-se maiores concentrações nas regiões Sudeste e Sul do Brasil e em cidades com população superior a 1 milhão (49%) e de 250 mil a 500 mil habitantes (35%).

Evolução do número de sistemas de micromobilidade no Brasil (2011-2020) com estações fixas com escala Metropolitana. Fonte: Plataforma Micromobilidade Brasil (2020).

Conforme apresentado no gráfico acima, após quase uma década (2011–2020) da consolidação da operação dos sistemas de bicicletas compartilhadas com estação nas cidades brasileiras, entre 2017 e 2019, acelerou-se a implementação dos sistemas de micromobilidade sem estação (dockless), com a chegada das patinetes elétricas (e-scooters) em 2018. No entanto, devido a dificuldades de regulação, sustentabilidade financeira das operações e aumento no número de acidentes, boa parte dos operadores encerraram suas atividades no início de 2020 no Brasil.

Visão e estratégias para a cidade

A cidade do futuro depende das ações que tomamos no presente. No Brasil, diversos problemas urbanos apresentam obstáculos para a vida de milhões de pessoas todos os dias, especialmente no campo da mobilidade. Mas sabemos que, agindo devidamente, as cidades têm nas mãos o poder de mudar a realidade tanto em escala local quanto em escala global. Assim, repensar a mobilidade urbana é essencial.

Diversos governos e organizações têm trabalhado juntos e concebido ideias para produzir uma mudança paradigmática em prol da construção de cidades mais sustentáveis. Movimentos de articulação em rede se destacam, por exemplo, a aliança C40, que conecta as lideranças de 98 megacidades em todo o mundo por um futuro mais saudável e sustentável. Esse projeto de governança busca efetividade nas políticas urbanas, entre elas as políticas de mobilidade, para a construção de ações mensuráveis contra a mudança climática. Nessa rede, há atualmente quatro cidades brasileiras (Curitiba, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo).

Outra experiência analisada para a criação da visão de cidade deste guia é a Estratégia de Municípios e Comunidades Saudáveis (MCS), da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), que preconiza como promotor maior da saúde a qualidade de vida urbana. Isso pode ser atingido facilitando os mecanismos para que as pessoas melhorem suas condições de vida. Um dos focos do MCS é justamente a mobilidade urbana sustentável, cujas ações estratégicas intersetoriais fora da área de saúde são determinantes para a melhoria da qualidade de vida da população e do meio ambiente urbano.

Novas experiências, análises de dados e promoção da economia de compartilhamento são ações que contribuem com esse quadro. A chegada e a consolidação dos sistemas de micromobilidade compartilhada transformaram diversas cidades em todo o mundo, acelerando a incorporação de tecnologias digitais de informação e comunicação (TDIC) e a inteligência nos sistemas de transportes (ITS). Nessa conjuntura, o incentivo à migração modal (de forma a dispensar o uso de automóveis particulares), especialmente em relação a viagens entre dois e cinco quilômetros, é um importante benefício dos sistemas de micromobilidade para a promoção de áreas urbanas mais limpas e saudáveis, ao mesmo tempo que apoiam os governos locais e nacionais a atingirem suas metas climáticas.

O aumento da presença e utilização desses sistemas reacendeu o debate sobre a necessidade de revisão de investimentos no espaço público, direcionando-os para a requalificação da infraestrutura urbana, a integração e a conectividade da rede de transportes e do sistema viário das cidades, visando priorizar as necessidades de deslocamento das pessoas e dinamizar as oportunidades de acesso a bens e serviços. Nesse campo, os sistemas de bicicleta compartilhada já têm uma história no Brasil. Porém, novos sistemas, como o de patinetes elétricas, carecem de regulação e produção de dados e análise de experiências em território nacional.

A expansão dessa modalidade de transporte é também uma questão de saúde pública, já que a exposição ao material particulado proveniente da queima de combustíveis fósseis tem sido correlacionada a sérios problemas respiratórios. As concentrações de material particulado são mais altas no entorno de vias de trânsito intenso, onde geralmente são utilizadas as soluções de micromobilidade. Por outro lado, a diminuição das frotas movidas a combustão melhora a qualidade do ar urbano, fato que pode ser fomentado pela ampliação dos sistemas de micromobilidade. Outro benefício para a saúde pública é a atividade física oferecida pelo uso de modos ativos, como as bicicletas, em contraste com meios  de transporte considerados passivos (ou motorizados). No entanto, a falta de padronização nas metodologias de análise de desempenho dificulta quantificar as emissões (e, mesmo, os impactos na saúde), uma vez que cada programa de compartilhamento de bicicletas opera de maneira distinta e, portanto, coleta dados de maneira diferente.

Como esses modos compartilhados potencializam uma ampla cadeia produtiva e de serviços, seus gestores, operadores e usuários são envolvidos em processos cada vez mais complexos de tomada de decisão multimodais. Além disso, a crescente disponibilidade de informação digital e em tempo real sobre esses sistemas e a possibilidade de integração tarifária estão contribuindo para ampliar o acesso e a utilização desses serviços de mobilidade sob demanda.

Guia Micromobilidade Compartilhada

Este relatório apresenta uma investigação completa sobre o panorama da micromobilidade pública no Brasil e no exterior. Trata-se de um trabalho de suma importância para gestores públicos e privados, e por se tratar de um trabalho sem paralelos no país, se torna uma referência nacional na conceituação e levantamento do quadro da micromobilidade.

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